domingo, 1 de maio de 2011

O QUE SE ESCONDE NESSE MANGUE?*

* um texto de muitos textos
“O que em mim sente está pensando”
Fernando Pessoa

Começo a achar que olhar para fora, mais que qualquer outra coisa, talvez seja olhar para si, para dentro. Lembro-me de um velho ditado que aprendi lá em Jataí, ainda criança, durante o sermão de um padre na missa: “quando você aponta um dedo para alguém, outros dedos de sua mão estão apontando pra você mesmo”.  Acho que, de alguma maneira, isso faz sentido. Lemos o “outro” como algo distante, fora, mas, na verdade todos os sentidos a “ele” atribuídos, as leituras distintas, partem de você.
Nesse processo, onde o olhar é protagonista,  tenho pensado muito sobre isso, a cada foto vinda de Recife, parece que revelamos a nós mesmos. As formas, cenários, cores e personagens de cada imagem abrem portas que acordam lembranças, sensações, desenham vazios, expectativas e sonhos. Quais as potências da experiência de olhar? “O que é ver? O que é o visível”?
Aristóteles perguntaria “a vista é o que nos faz adquirir mais conhecimentos, nos faz descobrir mais diferenças”?
“Por que o olhar ignora e é ignorado na experiência ambígua de imagens que não cessam de convidá-lo a ver”? (Adauto Novaes)
“O olhar deseja sempre mais do que lhe é dado a ver.” (idem)
 O sentir que se sente, o ver que se vê, não o pensamento de ver ou de sentir, mas visão, sentir, experiência muda de um sentido mudo...” (Merleau-Ponty)
A minha inquietação está relacionada a isso que está para além daquilo que é visto ou entre mim e o que estou vendo? Ou seria ainda sobre aquilo que sou capaz de ver a cada mirada nas imagens? Mas, o que vejo a cada vez que olho é passível de mudança, afinal eu mudo a cada minuto!
O que Recife e Brasília estão nos dizendo ou nós é que estamos dizendo por elas? Recorro ao Italo Calvino, no seu “As cidades invisíveis” para pensar um pouco essas viagens por imagens de uma cidade que não “possuímos ou habitamos”:
“Ao chegar a uma nova cidade, o viajante reencontra um passado que não lembrava existir: a surpresa daquilo que você deixou de ser ou deixou de possuir revela-se nos lugares estranhos, não nos conhecidos”
“O viajante reconhece o pouco que é seu descobrindo o muito que não teve e o que não terá.”
“cada pessoa tem em mente uma cidade feita exclusivamente de diferenças, uma cidade sem figuras e sem forma, preenchida pelas cidades particulares.”
“De uma cidade, não aproveitamos as suas sete ou setenta e sete maravilhas, mas a resposta que dá às nossas perguntas”
No final das contas, possivelmente não estamos falando de Brasília ou de Recife, falamos da cidade que carregamos em nós. Falamos dos simulacros presentes nas fotos?
“Simulacros são o invisível do visível, ou melhor, eles são a condição do ver: são “finas partículas da mesma forma e da mesma cor” que batem nos nossos olhos, apesar de a própria vista ser um contato” (Adauto Novaes).
Enfim, eu só queria compartilhar um pouco essas angústias sobre pensar o olhar, o que significa ver, percepção, relação com a cidade...aquilo que se revela a partir das fotos e que não necessariamente se mostram nas fotos...Pensando isso...me vem fragmentos de textos ditos na sala de ensaio:
“Quando eu era criança achava que cavalo marinho era do tamanho dos cavalos normais” (Lisbeth)
“Trabalho o dia inteiro pra vida de gente levar. Água vira sal lá na salina. Quem diminuiu água do mar?” (Canção do Sal, Milton Nascimento - música usada na cena do Alonso).
“Gente é meio como água, tá sempre correndo rumo à alguma coisa...” (narrativa do Francis para uma das fotos)
“Todo dia acordar...Eu queria saber exatamente pra quê que eu vim”! (Alonso)

Por enquanto é isso....
Francis Wilker

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