terça-feira, 15 de março de 2011

Universo onírico

A subjetividade de criar uma cena a partir de uma imagem me leva a mergulhar em um universo onírico de cores, sons e cheiros. Busco a poesia das pequenas coisas de um lugar que nunca fui de pessoas e de objetos desconhecidos e conhecidos ao mesmo tempo. Estou muito confuso neste processo, por mais que esteja clara a metodologia de criação, fica sempre um questionamento a ser esclarecido. Demorei muito tempo para escrever sobre o processo. Talvez seja porque não sei bem o que escrever, gostaria de colocar tudo o que as imagens me passam, mas sinto que as imagens se tornam cada vez mais inesgotáveis. Dentro do cronograma tenho que escolher uma nova imagem pra enviar aos companheiros de Recife, foi difícil, mas consegui escolher uma que me faz refletir sobre a esperança de se fazer arte e um país cada vez mais caótico. Escrever... Escrever... Escrever... Sentir... Buscar respostas... Fazer perguntas... trabalhar com as imagens para revelar novas imagens.

Jhony Gomantos

Janela de Criação nº 2 - Teatro do Concreto












Janela de Gestão – resposta do Magiluth para o Caso nº 1 – Concreto


Caso nº 1 – Concreto: Dentro de um mesmo coletivo há formas diferentes de pulsar. O ritmo de cada integrante em planejar, buscar soluções e realizar tarefas é diferente. Por outro lado, existe também o ritmo do Grupo e suas demandas.Sendo assim, como perceber o ritmo de cada um e construir a identidade do Grupo? Como respeitar e investir nessa diversidade para se garantir a eficiência e a eficácia do Grupo?


SOMOS UM SÓ?
Diante de todas as dificuldades de gestão enfrentadas pelo Magiluth ao longo dos sete anos de existência, a questão colocada pelo Concreto parece-nos explodir a cabeça, visto que acreditamos ter sido esta a mais constante e definidora na construção de nossa trajetória. Inúmeras discussões, divisões, reorganizações, saídas e entradas, quereres e mal quereres,  na tentativa de que o GRUPO permaneça intacto a todos os impropérios. Assim, apresentamos nosso corpo:
O PULSO AINDA PULSA?
O Magiluth surgiu dentro do campus da Universidade Federal de Pernambuco, como qualquer grupo, sem maiores pretensões, apenas com a vontade do ¨fazer¨ teatro, agregando  diferente visões e possibilidades do ¨pensar¨ teatro. Com o reconhecimento pela cena local do trabalho desenvolvido, impõe-se uma série de questões: Quem realmente somos? O que queremos com o nosso teatro? Para onde iremos? Somos um só?
E com o passar do tempo, a falsa de ideia de um bloco concreto de pessoas vai se diluindo e ampliando-se as diferenças de gostos, sensações e necessidades. Soma-se a isto a pouca idade dos integrantes (faixa média de 23 anos) aliada as descobertas de que teatro querem para suas vidas.
E o pulso? Ainda pulsa?
Daí em diante, o Grupo é colocado numa espécie de abismo. Onde se descobre que não basta só fazer teatro. Antes de tudo é necessário aprender a relacionar-se, desenvolvendo o grande exercício do ouvir, falar e calar-se quando necessário. 
E achar que minhas necessidades sempre são as mais corretas e interessantes torna-se uma armadilha mortal neste jogo da convivência.
ONDE ESTÁ MEU CORAÇÃO?
Diante dos conflitos pontuados, restávamos nos perguntar: onde está meu coração? Minhas vontades? Ainda valia a pena construir e pesquisa com este grupo? Coincidentemente, estes conflitos se deparam com outro problema: a saída da Universidade, que para muitos significa perdas no que diz respeito a pensões e auxílio familiares para sobrevivência, tornando o grupo o único trabalho oficial, mas que ao mesmo tempo não tem como responder financeiramente, pois sabíamos ser este um projeto de longo prazo.
Algo que lutamos até hoje é para fincar a ideia que o meu coração não deve estar em outro lugar a não ser no GRUPO. Diante disto, recebemos várias criticas de artistas da cidade, por nos acharem ¨fechados¨ demasiadamente.  Mas acima de tudo, queriamos desenvolver nossos projetos artístico, estético, pedagógico dentro do nosso coletivo. Ainda hoje temos sérias retenções aos atores que acham que podem ¨fazer tudo¨, estar em ¨todos os lugares¨ e que ainda acreditam que seu processo formativo não será abalado. Isto não impede os integrantes de desenvolverem projetos pontuais com outros coletivos, porém em nenhum momento o ¨projeto maior¨, o ¨nosso coração – grupo¨, poderá sofrer interferências.
E assim, muitos acabam não concordando com estes pensamentos e acabam desistindo desta longa jornada, ou por hora, são solicitados a não mais impedir a caminhada. E isto torna um novo baque: a sensação de que não somos invencíveis.
SIM! NÃO SOMOS INVENCÍVEIS
Engraçado buscarmos relações eternas numa arte tão efêmera. Quando o Magiluth inicia sua trajetória, o pensamento único e transbordante é de unidos para sempre, divisão de tudo, juntos na saúde na doença, na alegria e na tristeza. Como qualquer casamento, esta ¨relação ideal¨ acaba com a sensação de que, sim, somos seres com uma pluralidade tremenda de pensar, e que podemos sim conviver com situações extremas, tais como a saída de integrantes.
O mais interessante de constatar é que como qualquer CORPO, a perda de partes ou funções, faz desenvolver outras que tomam para si os espaços/funções outrora vazios. E a sensação única de que o GRUPO há de ser, sempre, maior dos que as pessoas permanece, pois ele representa o espírito e necessidade coletiva, da maioria. Após perdas e feridas, tudo se cura e a trajetória continua, talvez com um pouco mais de ¨dissidentes¨.
FISIOTERAPIA PARA MEUS MÚSCULOS
O Grupo-Corpo precisa andar. Para isto, as pernas desenvolvem maior desprendimento energético e de movimento. Algumas outras partes nem tanto. Quando o Grupo-Corpo necessitar se pendurar em algo, os músculos dos braços desenvolverão maior ação. E assim deve ser sempre. Devemos perceber o que fazemos com maior assiduidade: caminhar ou pendurar? E assim, estas pernas precisam de maior proteção, melhores tênis e acima de tudo, não podem desenvolver a função sozinha, precisa do apoio do quadril, tronco, braços, mesmo que sejam mínimos. Achar que todos podem, devem e realizam as mesmas funções é uma tolice.
Ah! Também é necessário entender a necessidade do cérebro. Sem ele, os movimentos tornam-se caóticos. Aceitar que algo maior deve nos direcionar é um exercício e algo típico de nossas relações diárias. Somos criados numa sociedade onde relações hierárquicas são extremamente claras, mas buscamos ao máximo um processo de relação comunista, defendendo a ideia tal quais homens-bombas. Achamos bela a ideia, mas pelo menos em nosso agrupamento não conseguimos desenvolver esta forma, talvez no futuro.
E ASSIM, SOBREVIVO
Hoje, após idas e vindas, derrotas e conquistas, percebemos que a melhor arte que podemos desenvolver é a de manter com atividade continua o GRUPO. E para isto exercitamos diariamente nossa convivência, respeitando o tempo e ritmo de cada um e também valorizando (financeiramente inclusive), o que mais estão a frente no processo. Artisticamente falando, criamos um projeto chamado Paralelo Magiluth, que possibilita que os integrantes exercitem pesquisas, não necessariamente a pesquisa principal do grupo onde todos estão inseridos, tornando possível o ¨matar a sede¨ pelas necessidades individuais. A prova disto, é o espetáculo UM TORTO, criado por apenas dois integrantes, que após reunião, demonstraram ao grupo a necessidade de pesquisar sobre determinado assunto e assim desenvolveram em dupla o projeto. A ideia foi tão bem aceita que hoje o espetáculo compõe o repertório do grupo. Ou seja, eles não precisaram se ausentar do agrupamento para desenvolver este trabalho que foi inclusive financiado pelo Grupo. Aprendemos também que é necessário leveza no tocar das situações, pois as dificuldades de ordem de sobrevivência são muitas e por vezes os atores também precisam desenvolver outros trabalhos. O importante é que o Magiluth, nosso foco, não seja ¨abalado¨ por nossas outras ações.
Porém, acreditamos não ter este assunto por encerrado, sabedores que o conflito desta ordem é constante e exigirá sempre de nós questionamentos e ponderações. Talvez ainda possa inclusive aparecer em novo post na janela de criação. Esperar para ver!

domingo, 13 de março de 2011

DIÁRIO DE BORDO N.4


Então é isso? Todo mês a gente se renova? Nunca tem fim?

Sobre a Demonstração N.1, ao invés de esclarecer nossas dúvidas, a conversa com o público após a apresentação só aumentou os nossos questionamentos. O que não é ruim. Vamos nos descobrindo aos poucos, diariamente, a cada ensaio, jogo, conversa.
A platéia não teve contato com as fotos previamente, mas durante o debate foram pontuados aspectos, percebidos pelas pessoas, que se relacionavam à nossa releitura cênica das imagens enviadas pelo Concreto. A sensação de cidade, de urbano, mesmo não utilizando cenários e com a iluminação chapada, foi um ponto muito comentado.
De tudo que foi conversado o eco que fica em nós é a necessidade de estarmos sempre nos questionando, refletindo sobre o que estamos fazendo, sobre os pontos positivos e negativos do processo, de nos reconstruirmos nos ensaios, todo dia dialogando com o novo, novas imagens e novas reações a elas.
Um projeto como esse nunca chega a um ponto final.

Thaysa Zooby.

terça-feira, 8 de março de 2011

Magiluth provoca diálogo entre concreto e mangue

por Eugênia Bezerra
Publicado em 06.03.2011 no JC

Três fotos do Recife para o grupo brasiliense, três fotos de Brasília para o grupo recifense. Trocando imagens das respectivas cidades, os grupos Magiluth e Teatro do Concreto (DF) já deram início ao projeto Do concreto ao mangue. A partir destas janelas para o universo do outro, que serão renovadas periodicamente, eles fazem reflexões e cenas que serão partilhadas no blog da pesquisa ou presencialmente. Na terça-feira passada, no Teatro Joaquim Cardozo, os integrantes do Magiluth fizeram uma demonstração aberta ao público da primeira cena que resultou deste processo. “Eles têm um trabalho muito voltado para o diálogo com a cidade. Acredito que para a gente vai ser muito legal, nosso trabalho dialoga com isso”, resume Giordano Castro, do Grupo Magiluth, que também é formado por Pedro Vilela, Pedro Wagner, Lucas Torres e Erivaldo Oliveira. “A ideia do grupo é se expor a coisas novas, não se acomodar e encontrar uma linguagem específica”, completa Vilela.
Os grupos se conheceram em um encontro do Movimento Brasileiro de Espaços de Criação, Compartilhamento e Pesquisa Teatral (Redemoinho). De Brasília, já chegaram imagens de uma rodoviária, um horizonte e de um homem em frente ao um outdoor. Para Brasília, o Magiluth enviou três fotos do rio próximo da sala onde estão criando, no Bairro do Recife. Uma delas mostra a vista da janela, a outra um barco parado e a última com um homem retirando lixo da margem.
Visões pessoais, inseridas no contexto das cidades de uma maneira geral (não só de Recife e Brasília). A relação com as outras pessoas e com o ambiente, as construções, os deslocamentos, muita coisa pode sair daí. A ideia deles é não enviar informações adicionais sobre as fotos para o outro, como legendas com a ideia de quem fez a foto. O que a imagem evoca, além do que cada um conhece sobre o outro grupo e a outra cidade, alimentam os processos criativos.
Além desta troca de “janelas de criação” os grupos também planejam encontros presenciais nos próximos meses. Estes contam com a coordenação do diretor Luis Fernando Marques, do elogiado Grupo XIX de Teatro (SP), que já passou pelo Recife com a peça Hysteria. A escolha dele tem a ver com a ideia de pensar a cidade, já que uma das características do coletivo é a escolha de espaços diferenciados para a apresentação dos espetáculos.

sexta-feira, 4 de março de 2011

Janela de Gestão - resposta do Concreto para o Caso nº 1 - Grupo Magiluth


Caso nº 1- Grupo Magiluth: Como integrar as necessidades estéticas do grupo, as necessidades específicas de editais, leis de incentivo e patrocinadores diretos, além de manter o diálogo artístico com a cidade em que estamos inseridos?

Muitos olhares para a mesma janela
Essa questão suscitou discussões calorosas em nosso coletivo sobre várias facetas: desde as formas de sustentabilidade, estratégias com empresas e a função e definição da arte. Abaixo, elencamos algumas dessas reflexões e reverberações que até ampliam a questão em si. Nesse sentido, discutir um case para vocês nos faz olhar para nosso grupo.

Janelas da alma: ser ou não ser? Eis a primeira questão.
Antes de discutir sobre sustentabilidade e editais, ou qualquer outra forma de patrocínio, um ponto que achamos essencial é pensar na identidade do nosso grupo: quem somos? Onde queremos chegar? Que arte queremos fazer? Qual a nossa missão? Que relação queremos estabelecer entre os integrantes do grupo? Que relação queremos estabelecer com os profissionais e outros artistas da cidade? Que relação ou diálogo queremos estabelecer com  a cidade? Qual a nossa causa? Qual a nossa visão de futuro? Enfim, que grupo somos?

A clareza dessa definição do grupo que queremos ser e da arte que queremos fazer será a base para discutir se há essa integração com editais, leis e patrocinadores diretos. Essa definição irá pautar a decisão sobre as formas de sustentabilidade, que recursos buscar, que editais concorrer, que relação o grupo terá com os recursos e as variadas fontes de renda e sustentabilidade junto a qualquer parceiro, seja da 1º (governo), do 2º setor (iniciativa privada) ou do 3º setor (sociedade civil organizada).

Vendo a cidade pela janela: manter um diálogo artístico com a cidade é uma necessidade artística do grupo?
Nesta definição o grupo deve se perguntar se esse diálogo artístico com a cidade é uma necessidade artística. Podemos dividir esse diálogo em duas dimensões: 

 ·         uma dimensão que é inerente a estar em uma cidade, o que nos impõe um diálogo que acontece pelo simples fato de habitarmos esse espaço, ele nos informa e nos impacta, dialogar com a cidade é condição  sine qua nom.

·         uma dimensão que vai além desse diálogo natural que ocorre, um diálogo artístico intencional com a cidade.

Em relação a esse diálogo mais intencional com a cidade, entendemos que desejar isso já é uma necessidade estética do grupo, ou seja, inerente a sua poética. Agora, as formas que esse diálogo pode tomar são muitas:  a cidade pode ser lida como tema; o grupo pode propor ações de trocas e compartilhamento, ações em escolas, publicações, ações de formação, ações com outros coletivos teatrais e etc

No Teatro do Concreto esse nosso diálogo é intencional e provocado por nós mesmos em nossas criações. No Diário do Maldito, por exemplo, fizemos várias experimentações em vários  espaços da cidade que nos informavam o lado marginal da cidade que tinha a ver com o Plínio. No Ruas Abertas, o processo foi diretamente relacionado a esse diálogo mais espacial com  a cidade pelas suas veias: as ruas. No Entrepartidas habitamos a cidade com um espetáculo que é feito num ônibus e em vários pontos da cidade. Esse diálogo artístico já carrega em si um diálogo político também com nossa cidade des-planejada.

Outro diálogo interessante é o diálogo político propriamente dito: mobilizações e ações com outros coletivos de teatro, outros artistas e a comunidade como o Concreto Aberto (palestras com profissionais de diversas áreas para discutir os temas que tenham a ver com nossa produção artística), Concreto nas Escolas (diálogo com os estudantes de arte nas escolas públicas), Fórum de Teatro de Grupo do DF (que promovemos em parceria com outros coletivos),  Centro de Referência e Memória do Teatro Candango (um projeto que estamos implementando aos poucos em nossa sede), e a própria sede do nosso grupo. E outras ações menores como palestras, reuniões e etc.

Então, o grupo deve se perguntar que diálogo quer fazer e pensar as estratégias e meios para estreitar esse diálogo se assim o quiser.

As janelas podem nos limitar ou nos permitir ver outros horizontes: O que seria uma integração entre as necessidades estéticas de um grupo e as necessidades específicas de editais, leis de incentivo e patrocinadores diretos? 

Tudo interage e impacta diretamente em uma criação:
Em primeiro lugar pensamos que todo processo artístico está inserido numa rede de "estímulos e limitações" que interfere na criação, desde o espaço onde o trabalho está sendo desenvolvido, os recursos existentes, o clima, a cultura local...tudo isso atravessa um processo artístico, afinal, a arte age no mundo e vice versa. Pensando assim, prazos estipulados, recursos disponíveis, natureza das contrapartidas, itens presentes num edital, sempre irão, de alguma forma, impactar a arte gerada nessas condições. 

Quanto aos editais e o nosso desejo artístico: E se não quisermos construir uma janela aqui?
Na esfera mais específica de reflexão que vocês estão propondo, entendemos que primeiramente, o grupo deve ter como princípio ao inscrever trabalhos em editais e nas captações diretas de recursos a preservação de seus valores éticos e estéticos (sua identidade como falamos acima). Geralmente, os editais públicos apresentam diretrizes, critérios, prazos, procedimentos e categorias, como a manutenção de grupo, montagem de espetáculo, circulação, contrapartidas sociais, formas de prestação de contas, etc. De uma forma ou de outra, há uma interferência direta na estética do trabalho. Isso é tão complexo que há muitas críticas e reflexões sobre a interferência dos editais e das leis de incentivo na produção cultural de toda uma sociedade. Por outro lado, cada vez mais encontramos editais que prezam pela autonomia, diversidade, sustentabilidade dos grupos, na pesquisa desenvolvida,  no ineditismo da obra e na circulação. Portanto, cabe ao grupo, a partir dos seus interesses estéticos, dialogar com o foco dos editais (objetivos, planejamento, capacidade de realização, etc) e fazer inscrições mais direcionadas ao tipo de trabalho desenvolvido.

Aqui no Concreto, por exemplo, tínhamos criado uma série de intervenções cênicas para espaços urbanos, quando apareceu o edital da Funarte para Artes Cênicas nas Ruas, aproveitamos o incentivo para seguir com um trabalho que o grupo já estava desenvolvendo. Já no prêmio Interações Estéticas, também da Funarte, na primeira edição não tínhamos um trabalho prévio convergente com o edital, porém, era convergente com o nosso desejo de ampliar o diálogo com outros grupos do DF em torno do processo colaborativo de criação. A partir dessa reflexão criamos um projeto de oficinas de processo colaborativo e diálogo com outros 04 grupos do DF e o mote de criação usado na oficina era o tema "Amor e Abandono", tema esse que era o foco da pesquisa do Concreto que estava em curso. Assim, a um só tempo conseguimos dialogar com a cidade, com outros grupos e ainda ter outras visões para o tema que estávamos pesquisando na sala de ensaios.  Integramos esse impacto direto com nosso desejo artístico.

Com relação aos editais, é importante então cada grupo ter uma comissão ou pessoas responsáveis por estar atento a eles e a suas propostas. O outro cuidado é buscar convergência entre os editais, senão o grupo pode ficar com uma agenda muito complicada de necessidades ditadas pelos editais e acaba não tendo fôlego para existir. Aprendemos isso a duras penas!

Os patrocinadores diretos: eles querem colocar uma logomarca na frente da nossa janela?
Em relação a patrocinadores diretos, o grupo deve buscar “ganchos” entre o seu projeto e o perfil da empresa. Segundo Rômulo Avelar, em seu livro “O Avesso da Cena”, o termo gancho significa um atributo que associa indiscutivelmente um ação a uma empresa ou a um tipo de produto, favorecendo a percepção, pelo publico, do vínculo estabelecido com o patrocínio”. O grupo deve apresentar suas propostas estéticas e características específicas do trabalho sensibilizando a ampliação do olhar da empresa para novas formas teatrais e buscando que a empresa perceba que as propostas experimentais também possibilitam atingir um público diverso e diferenciado, se for o caso. Em um contato com a empresa, é importante afirmar que não é um pedido de patrocínio, mas o estabelecimento de uma parceria; e que nessa parceria existem moedas de troca, como a inserção da logomarca da empresa nas mídias, material gráfico do projeto, peças promocionais etc, buscando minimizar (ou se possível até eliminar) as interferências estéticas divergentes com a identidade do grupo. Se é necessário adequar, o grupo deve responder antes até onde ele irá e se isso não o descaracteriza. Numa condição ideal (talvez utópica, pelo contexto que vivemos), o bom seria que essas interferências não existissem. Nesse sentido, e guardadas as devidas proporções, esse diálogo pode ser muito rico tanto para a empresa, quanto para o grupo quanto para a cidade que se beneficiará com as produções advindas das parcerias.

Sobre a natureza dos “ganchos”: queremos dizer em qual janela sua logomarca vai ficar!
A inserção de uma simples logomarca numa peça de divulgação da peça, num programa ou num livro  já é uma interferência estética. Por exemplo: uma logomarca da OI diz uma coisa bem forte que está ligada à arte digital, comunicação e simplicidade em comunicar com as pessoas. A da Petrobrás informa outra coisa, uma empresa brasileira que tem pesquisa tecnológica na área de energia. Se for um CCBB, o recado é outro por estar ligado a um banco. E isso diz de um grupo! Quando vejo que um grupo tem logomarca da Petrobrás, isso me faz olhar diferente (nossa, ele conseguiu patrocínio da Petrobrás! É quase um selo de qualidade! Ou não para outra pessoa que poderia pensar: esses artistas ainda ganham dinheiro público para fazer essa arte?) Esses ganchos acima criados para seduzir a empresa também são interferências estéticas, são produtos artísticos, ações do grupo, então, são novas ações (estéticas?). Só não haveria interferência direta (se tal coisa for possível) se já casar “como uma luva” na identidade do grupo e no que ele se propõe a fazer.

Suas janelas me sufocam! Quero passar pela porta.
Existe uma forma diferente de dialogarmos com a economia vigente? Existe uma economia da arte? O que o seu grupo pode fazer sem perder sua identidade?

Nas questões que levantamos acima, está presente uma estrutura de pensamento mais corrente no universo da produção cultural. Porém, achamos importante que nós, grupos, procuremos conhecer outras linhas de discussão mais recentes que têm pensado algo como "economia da arte" e que não entendem essas parcerias como uma simples moeda de troca, ao contrário, estão discutindo qual a natureza da contrapartida, em se tratando de arte; como a arte, que tem processos muito específicos pode dialogar com a economia capitalista (já que é impossível se despir dela); além disso, existem já algumas experiências de outras formas de organização da produção cultural, a exemplo do movimento Fora do Eixo que tem impactado as bandas independentes e também o Cubo Card, que se tornou uma moeda complementar à nossa moeda oficial e ajuda a movimentar de uma outra forma os agentes do meio cultural. 

Realmente é um desafio conseguir recursos e apoios, mantendo o diálogo com a cidade e o desenvolvimento de pesquisa e produção estética próprias. Porém, suponhamos que, por conta de uma crise fulminante, a maior parte das formas de financiamento e leis de incentivo acabassem e que os patrocinadores diretos com receio dessa mudança, buscassem uma postura mais cautelosa e retirassem os apoios.  Isso significaria deixar de fazer teatro? Deixar de lado a pesquisa e a criação? Na verdade, a questão é não se manter refém de editais e empresas. Isso é possível?

Deve-se pensar que os trabalhos realizados e espetáculos criados não se destinam para atender, simplesmente, editais. O foco, se o grupo assim entender, poderia ser encontrar formas de sustentabilidade do grupo e, conseqüentemente, dos seus valores estéticos. Há grupos que criam núcleos e possibilidades de trabalho para reverter essa situação. Um exemplo dado no “Avesso da Cena” é o case do Grupontapé. O grupo de Uberlândia trabalha com teatro empresarial e tem nessa atividade, uma maneira de financiar outros trabalhos artísticos do grupo. 

Em um evento de São Paulo tivemos contato com um grupo do sul que eles vivem de teatro e suas peças têm um preço, isso é inegociável, assim eles conseguem ter uma renda para manter uma rotina de ensaios. Outro grupo que conhecemos também em São Paulo, cobra cachês de acordo com o cliente, em escolas públicas e na comunidade faz de graça, e se o cliente for uma grande empresa, o cachê é mais gordo. Além das trocas com a própria comunidade onde a sede deles está.

 Há diversas possibilidades e muitos exemplos interessantes de sustentabilidade. Uns que buscam e criam produtos que ajudam na sua sustentabilidade e outros onde sua própria produção artística já permite a sua subsistência. Quais seriam as nossas outras estratégias de sustentabilidade? É possível um grupo de teatro ser sustentável? Esses ‘ganchos’ são possíveis no seu grupo? Casam com sua identidade?

Uma janela para várias janelas
Discutir o relato de vocês dessa 1ª janela de gestão, mais que gerar respostas em nós, acordou velhas questões e fez nascer tantas outras que queremos compartilhar:

 Todo edital interfere e direciona a estética do grupo?
Como é não se tornar refém de editais e patrocinadores?
Como se manter fiel à sua necessidade estética?
O que é sustentabilidade?
Existe alguma possibilidade de sustentabilidade fora do sistema capitalista?
Existe alguma possibilidade de sustentabilidade para grupos de arte no sistema capitalista? Em nossa economia?
Quando foi que na História da Arte, artistas não fizeram concessões?
O que é uma concessão?
Que concessões o grupo se permite fazer hoje?
Quando foi que na História da Arte os artistas fizeram concessões? E em que contexto?
É possível fazer arte sem concessões?
Quanto custa/o que custa ao artista fazer uma concessão?
Que concessão seu grupo nunca faria?
Os outros meios fazem concessões? Outras profissões, outros meios de produção?
A concessão deve, ou pode, viabilizar uma sustentabilidade?
Qual a relação entre sustentabilidade e a identidade (necessidades estéticas) do grupo?
Estamos abertos ao diálogo com as empresas?  O que esse diálogo pressupõe?
É possível fazer arte no Brasil sem subvenção do estado?
É possível fazer arte no Brasil sem subvenção do poder privado?
É possível a arte ser mais autônoma em sua produção nessa economia em que estamos inseridos?
O que é economia? O que é arte? O que é teatro? Existe uma economia da arte? Existe uma economia do teatro? Quais os diálogos necessários entre economia e arte para que as concessões não descaracterizem o que seu grupo entende como arte?
Só é arte quando tem público?  O que é público? Vamos definir o que é o público?  É quantidade? É o quê? É formação de platéia? É formação de consumidores da arte?
Quando falamos em público, até que o público impõe uma questão estética divergente com a identidade do grupo?
Os editais de manutenção de grupo que temos hoje, de fato suprem as necessidades de um coletivo estável e que busca continuidade?
A arte que estamos fazendo faz sentido para o público de hoje?
O que é fazer sentido?
A arte que estamos fazendo deve fazer sentido para o público de hoje?

quinta-feira, 3 de março de 2011

Nova integrante do Concreto

Olá, gente! Na semana passada o Teatro do Concreto recebeu uma nova integrante! A Ana Clara, filha da Ivone e do Igor. Seja bem vinda!

"Santa Clara Clareou
Oh! Oh!
E aqui quando chegar
Vai clarear
Ah! Ah! Ah!
Santa Clara Clareou
Oh! Oh!
E aqui quando chegar
Vai clarear
Ah! Ah! Ah!
Os meus caminhos
Os meus caminhos..."

Beijos!
Francis

terça-feira, 1 de março de 2011

Do concreto ao mangue - Diário de Pernambuco

Por Pollyanna Diniz - http://www.diariodepernambuco.com.br/2011/03/01/viver10_0.asp

Magiluth, do Recife, e Teatro do Concreto, de Brasília, fazem intercâmbio com projeto do Itaú Cultural

Escrever um texto teatral a partir de fotografias de uma cidade - que não é a sua. Para realizar essa tarefa, os integrantes do grupo Magiluth - que tem no repertório os espetáculos Corra, Ato e 1 Torto - criaram um jogo de improvisação. Deu tão certo que eles contam que voltaram à adolescência. Dividem as tardes entre o jogo, os ensaios para o novo espetáculo do grupo, que tem nome provisório de O canto de Gregório, e os trabalhos de produção.
Hoje, às 19h30, os garotos recebem o público no Teatro Joaquim Cardozo, no Centro Cultural Benfica, para apresentar a primeira cena resultante desse jogo; depois, debatem sobre o processo de criação. O jogo não é à toa - o Magiluth foi um dos contemplados pelo edital do Rumos Itaú Cultural - Teatro para realizar um intercâmbio com outra companhia brasileira, no caso, o Teatro do Concreto, de Brasília.

Durante seis meses, os dois grupos vão trocar experiências artísticas, estéticas e de criação, e também relativas à gestão das companhias. A cada mês, cada uma das companhias tem a responsabilidade de enviar três fotos da sua cidade a outra; a partir daí, são criadas cenas curtas de, no máximo, 15 minutos. ´A nossa maior dificuldade foi inventar essa metodologia de trabalho, depois de receber as imagens. Porque o Teatro do Concreto já tinha essa experiência de criar a partir de fotografias`, explica o ator Pedro Vilela.

Em junho, os pernambucanos recebem a visita dos brasilienses, sob a coordenação do diretor Luis Fernando Marques, do grupo XIX, de São Paulo, que tem experiência com investigações urbanas; depois, é o Magiluth quem vai a Brasília. Tanto aqui quanto lá, há a previsão de apresentações ao público, embora o projeto, intitulado Do concreto ao mangue - Aquilo que meu olhar guardou para você, não tenha necessariamente a intenção de montar um espetáculo único.

Teatro de pesquisa

Os integrantes do Magiluth se reuniram na Universidade Federal de Pernambuco em 2004. Talvez por isso, a pesquisa, o experimentalismo e a necessidade de se arriscar - às vezes com resultados positivos, outras nem tanto -, ao fazer teatro sejam tão presentes nos espetáculos do grupo. Os artistas do Magiluth e do Teatro do Concreto se conheceram em 2009, durante a reunião de um movimento de teatro de grupos, que visava compartilhar experiências e pesquisas. Ainda assim, ao vivo, eles nunca viram apresentações um do outro. ´E mesmo assim percebemos que discutimos coisas semelhantes nos espetáculo. O grupo deles também é formado basicamente por estudantes, recém-formados, é ligado à questão da pesquisa, trabalha com dramaturgia própria`, diz o ator Giordano Castro. ´Eles tem como referência o teatro da Vertigem`, complementa Pedro Wagner, também ator. No país, este edital do Itaú Cultural premiou 11 projetos, sendo 22 grupos participantes. No caso do Magiluth e Do concreto, cada grupo recebeu R$ 44 mil para viabilizar o projeto.

Serviço

Do concreto ao mangue - Aquilo que meu olhar guardou para você
Onde: Teatro Joaquim Cardozo
Quando: hoje, às 19h30
Quanto: entrada gratuita

Saiba mais

As experiências dos intercâmbios estão registradas nos blogs
http://doconcretoaomangue.blogspot.com/ e http://www.projetoabuso.blogspot.com/